A decretação do divórcio sem a realização de partilha de bens e a usucapião pelo ex-cônjuge - RESP Nº 1.840.561/SP
Conforme previsão do art. 1581 do Código Civil, o divórcio poderá ser decretado sem a necessidade de que a partilha de bens tenha sido homologada ou decidida, com a ressalva de que caso venham a contrair novo casamento, este se dará obrigatoriamente sob o regime da separação obrigatória de bens (art. 1.523, III, CC) – norma de proteção patrimonial.
Em razão disso, uma questão que vem sendo enfrentada pelos Tribunais é a possibilidade de um dos ex-cônjuges, após a decretação do divórcio, usucapir em nome próprio imóvel que pertencente ao casal e que ainda não foi objeto de partilha.
O tema foi tratado recentemente pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n. 1.840.561-SP.
No caso, as partes eram casadas desde 1970, se divorciaram em 1983, mas nunca realizaram a partilha de bens. Após a extinção do vínculo conjugal pelo divórcio, o ex-cônjuge varão deixou os imóveis (unidades autônomas) nas mãos da ex-esposa, não protestando pela regularização dos imóveis (partilha de bens). Da mesma forma, nunca se opôs à posse que ela vinha exercendo sobre o bem imóvel comum e nem pelo percebimento dos respectivos frutos ou mesmo prestação de contas. Diante disso, a ex-cônjuge virago, por estar na posse dos imóveis há mais de 23 anos, intentou a ação de usucapião extraordinária em face do ex-marido.
Conforme o posicionamento adotado pela 3ª Turma nesse julgamento, “o condômino tem legitimidade para usucapir em nome próprio”, desde que observados os requisitos próprios da Ação de Usucapião.
O entendimento partiu da premissa de que um dos efeitos da adoção do regime da comunhão universal ou parcial de bens é o estabelecimento da “mancomunhão” em relação aos imóveis adquiridos na constância do casamento, isto é, o direito de propriedade e posse dos imóveis adquiridos pertencem ao casal como um todo, não se delimitando, à primeira vista, pela porcentagem que cabe a cada um.
Assim, conforme destacado pelo Ministro Relator Marco Aurélio Belizze, a partir do momento da extinção do vínculo conjugal (separação ou divórcio), cessa o estado de “mancomunhão” dos bens comuns e, enquanto não realizada a partilha, a propriedade do casal rege-se pelo instituto do condomínio.
Na referida decisão, a tese de defesa do cônjuge, de que a autora da ação de usucapião era possuidora indireta e estava desempenhando mera função de administradora dos bens condominiais (que estavam alugados para terceiros), a impedir a usucapião, nos termos do artigo 1.324 do Código Civil, foi afastada em razão da inexistência de repartição dos frutos ou pedido de prestação de contas pelo réu por todo esse tempo, configurando verdadeiro abandono de sua fração ideal.
Podemos concluir, portanto, que após a extinção do vínculo conjugal, a regularização da partilha dos bens comuns pelos ex-cônjuges deve ser priorizada de modo a evitar que um deles seja prejudicado em razão de sua própria inércia, já que conforme o antigo brocardo jurídico “o direito não socorre aos que dormem”.
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Aug, 22